INSS deve aceitar certidão – 09/03/2023
Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações da Folha de S. Paulo e do MPF)
INSS deve aceitar certidão – Declarações feitas pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas – Funai como prova de casamento ou união estável entre indígenas devem ser aceitas pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS. A sentença da 5ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Pará acolhe ação da Defensoria Pública da União – DPU.
O entendimento tem abrangência nacional a pedido do Ministério Público Federal – MPF, e contempla casos de recebimento de pensão por morte. O INSS tem 180 dias para dar início ao cumprimento.
A ação revelou casos de indígenas que não puderam obter a pensão por morte por não terem selado seu matrimônio ou sua união aos moldes do Código Civil. Ao contestar a ação, o INSS alegou que a concessão do benefício poderia ser feita somente diante da apresentação de documentos como certidão de casamento, declaração de união estável ou comprovação de conta corrente conjunta.
A DPU reconhece, porém, que os documentos usados como prova material nem sempre são acessíveis aos povos originários. Para o Ministério Público Federal, as exigências feitas pelo INSS violam o tratamento conferido pela Constituição Federal aos povos indígenas ao reconhecer o direito dessas comunidades de não serem integradas ou assimiladas à força pela sociedade não indígena.
O MPF também considera que os documentos emitidos pela Funai atestando relações de casais indígenas para efeitos de pensão por morte são dotados de fé pública, o que significa a presunção de que seu conteúdo é verdadeiro e que as informações somente podem ser desconstituídas por robustas provas contrárias, jamais por arbítrio do INSS.
Segundo a advogada indígena Joélen Oitaiã, membro da Comissão da Diversidade Racial e Etnia do IBDFAM, com essa decisão a Funai terá uma atuação mais abrangente. “A decisão é um marco na história de povos indígenas, que tanto sofre por estas autarquias, na questão da comprovação documental.”
“Acredito que os direitos dos povos indígenas não se misturam com a cultura indígena. Pensão por morte é direito exposto na nossa legislação e deve ser amplo, para todos”, frisa a especialista.
Segundo ela, o principal desafio atualmente é a informatização. “Muitos povos indígenas que vivem aldeados não têm acesso à internet. Isso atinge o modo cultural e dificulta o acesso aos benefícios”, afirma.
Prova material
Conforme a decisão, o INSS deve aceitar o documento como comprovante de união estável independentemente do momento de sua confecção quando a Funai indicar que a declaração tem validade indefinida; ou ao menos aceitar a declaração da Funai como início de prova material e dar, ao requerente da pensão por morte, acesso ao procedimento de justificação do requerimento.
Para o advogado Anderson De Tomasi Ribeiro, presidente da Comissão de Direito Previdenciário do IBDFAM, as exigências feitas pelo INSS “não fazem nenhum sentido”. Ele concorda que as alegações da autarquia violam o tratamento conferido pela Constituição e desrespeitam os usos, costumes e tradições indígenas.
O especialista lembra que a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho – OIT, no artigo 1°, item 1, alínea b, bem como a Declaração Americana sobre os Direitos dos Povos Indígenas reconhece e preserva a autoidentificação como elemento essencial para determinar a condição de indígena.
“Ponto importante tratado na ação é a existência de comunidades indígenas que residem em centros urbanos, mais adeptas à cultura não indígena. Entretanto, há inúmeras comunidades que vivem em isolamento e distantes de centros urbanos”, reconhece Anderson.
Ele acrescenta: “Esta decisão é de suma importância para avanços em outras situações, pois há respeito à tradição. Não faz sentido obrigar povos indígenas estabelecerem união estável nos moldes da população não indígena, principalmente, obrigando-os a produzir prova documental”.
Anderson De Tomasi avalia que “o equívoco do INSS de fazer distinções desarrazoadas entre relações, é comum e está no texto da Instrução Normativa 128/2022”. Segundo o advogado, este fato ocorre a exigir mais de uma prova para a união estável, enquanto que para o casamento a própria certidão é suficiente.
A saída para superar esta distinção, de acordo com o especialista, é trazer para o debate o Tema 809 do Supremo Tribunal Federal – STF, que entendeu ser inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros.
“Precisamos avançar. Deve haver respeito às culturas e tradições, pois a lei não pode exigir uma padrão de conduta da sociedade. Do contrário, não estamos proporcionando a todos, de forma igualitária, a inclusão social”, conclui Anderson De Tomasi.
Processo 1001534-67.2019.4.01.3900
Por Débora Anunciação
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