Racismo – 26/01/2023
Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações do G1)
Racismo – Caso de grande repercussão nacional, a tatuagem do rosto de um menino negro na pele de um desconhecido, sem autorização dos pais, chegou à Justiça. Agora, a família da criança pede indenização por danos morais contra o tatuador e a organização do evento no qual o desenho foi realizado.
Em outubro de 2022, a mãe da criança denunciou por meio das redes sociais que o uso da imagem não havia sido autorizado pelos pais nem pelo fotógrafo autor do registro. Disse ter descoberto por internautas que o rosto do filho havia sido tatuado em uma pessoa desconhecida de outro Estado.
Em nota publicada em sua rede social, o tatuador afirmou que não teve má-fé e pediu desculpas para a família e para a comunidade negra. Informou ainda que iniciou o processo de cobertura da tatuagem.
Em dezembro, a família ajuizou um pedido para que a identidade da pessoa tatuada fosse revelada. Em entrevista ao G1, a defesa da família afirmou que o objeto da ação pode cair, em razão da cobertura da imagem. Agora, os familiares buscam o direito à indenização. O valor pedido não foi divulgado.
João Batista de Oliveira Cândido, advogado, professor e cofundador do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, afirma que a utilização da imagem, sem qualquer respeito pela criança, poderia ser enquadrada na Lei Antirracismo (7.716/1989). Em seu artigo 20, a norma prevê como crime a conduta de “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.”
Autorização expressa
Racismo – O advogado entende que o comportamento induz ao desrespeito à população negra. “No Brasil, não se vê crianças brancas sendo reproduzidas em tatuagens de corpos sem a devida autorização dos pais, como fizeram com esta criança negra.”
Segundo João Batista, tatuagens que reproduzem imagens de pessoas só podem ser realizadas com autorização expressa das mesmas, o que não ocorreu no caso concreto. “A possibilidade de remoção compulsória não parece possível, em razão do princípio da intangibilidade do corpo, previsto nos artigos 13 e 15 do Código Civil.”
Para o especialista, o homem branco que faz a tatuagem de uma criança negra no corpo e se nega a retirá-la, posto que não autorizada a utilização da imagem, demonstra a falta de respeito à dignidade da pessoa humana e dissemina o racismo. “Se sente dono de corpos negros a ponto de aprisioná-los ao próprio corpo, como escravos, devendo ser enquadrado e punido com base na Lei Antirracismo.”
Proteção constitucional
O diretor nacional do IBDFAM explica que o direito de imagem tem proteção constitucional estabelecida na regra do inciso X do artigo 5° da CF/88. “Independente da forma como é reproduzida, seja por foto, tatuagem ou de qualquer outro modo, não pode ser usada por ninguém enquanto não autorizada pelo retratado.”
De acordo com João Batista, no caso de crianças e adolescentes, a autorização deve ser dada pelos representantes legais, pais ou tutores. “Estes devem respeitar os princípios próprios da Constituição e do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA.”
“A CF/88 traz o princípio da proteção integral da criança e do adolescente no artigo 227, observando-se que devem elas ser colocadas a salvo de toda a forma discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”, afirma.
Racismo – Ele cita ainda o Código Civil, no que diz respeito à proteção ao direito da personalidade. “Não bastassem todas essas leis, é ainda de se chamar a atenção, no caso concreto, para a Lei dos Direitos Autorais (9.610/1998), já que foi utilizada uma fotografia da criança, sem que houvesse autorização do fotógrafo.”
“Em resumo, tivemos a violação de preceitos constitucionais e infraconstitucionais, entre estes o ECA, o Código Civil e a Lei de Direitos Autorais. Algo que agrava ainda mais, é que esses fatos se deram porquanto, no Brasil, infelizmente existe grave preconceito racial, e por isto não se respeita o corpo da pessoa preta”, pondera o advogado.
Responsabilidade civil
O especialista considera que há responsabilidade civil do tatuador, da empresa que promoveu o evento e premiou a tatuagem, e daquele que contratou e fez o desenho. “Neste caso, responsabilidade civil por danos morais e materiais em razão das consequências psicológicas que atingiram a criança e toda sua família, provavelmente exigindo gastos com tratamentos psicológicos, em decorrência dos desgastes provocados pelos fatos.”
João Batista de Oliveira Cândido aponta a necessidade de compreensão por parte dos responsáveis pelo cuidado dos direitos das crianças e adolescentes, sobretudo quanto ao uso da imagem. “É comum ver pais e responsáveis postarem nas redes sociais imagens de seus filhos, desconhecendo o direito dos mesmos ao respeito e dignidade, consoante expresso na regra do artigo 17 do ECA, em especial quanto à inviolabilidade do direito de imagem do filho.”
“Os pais e responsáveis são, juntamente com a família e a sociedade, os promotores da defesa do princípio da proteção integral das crianças e adolescentes. Esse comportamento, além de violador desses direitos, os expõe a vários riscos, que vão desde a violação da imagem até outros tipos de violência, como a exploração sexual”, afirma.
Ele acrescenta: “Estes fatos constituem abuso do direito da autoridade parental, por parte dos pais e responsáveis pelos menores, sendo, portanto, outro tema reflexivo e importante, constituindo-se num impacto ao Direito das Famílias”.
De acordo com o cofundador do IBDFAM, é importante ampliar o foco da discussão. “Esperamos que este lamentável episódio não apague a alegria desta e de tantas outras crianças e sirva de alerta. Um sinal importante para a necessidade de mudanças no comportamento das famílias quanto ao uso da imagem das crianças e adolescentes.”
Por Débora Anunciação
Para mais notícias clique aqui
Conheça o site – www.direitoparamulher.com.br